Sim, Fiódor Dostoiévski, um dos maiores escritores russos, foi de fato viciado em jogo. Esse aspecto de sua vida não apenas influenciou sua situação financeira e emocional, mas também deixou marcas profundas em sua obra literária, como no romance O Jogador (Igrok, 1866), que reflete suas experiências pessoais com o vício.
Dostoiévski começou a se envolver com jogos de azar, especialmente a roleta, durante suas viagens pela Europa na década de 1860. Ele frequentava cassinos em cidades como Wiesbaden, Baden-Baden e Homburg, muitas vezes movido por uma mistura de desespero financeiro e uma busca por emoção. O escritor tinha uma personalidade intensa e impulsiva, e o jogo parecia oferecer uma válvula de escape para suas tensões internas, ao mesmo tempo em que alimentava sua crença quase supersticiosa de que poderia "vencer o sistema" e resolver suas dívidas.
 
Esse vício trouxe consequências graves. Dostoiévski perdeu grandes somas de dinheiro, chegando a empenhar bens pessoais, como roupas e joias, e a pedir empréstimos a amigos e editores. Sua segunda esposa, Anna Grigoryevna, descreveu em suas memórias como ele ficava obcecado após cada perda, prometendo parar, mas voltando ao cassino logo depois. Apesar disso, Anna desempenhou um papel crucial em ajudá-lo a controlar o hábito com o tempo, especialmente após o nascimento de seus filhos, quando ele gradualmente abandonou o jogo.
 
Literariamente, o tema do jogo em O Jogador é explorado com profundidade psicológica. O protagonista, Alexei Ivanovich, reflete o tormento de Dostoiévski: a compulsão, a autossabotagem e a tensão entre racionalidade e paixão. A obra foi escrita sob pressão financeira — ele precisava de dinheiro rápido para pagar dívidas de jogo —, o que torna o texto ainda mais autobiográfico. Além disso, o vício de Dostoiévski ecoa em outros trabalhos, como Crime e Castigo, onde o conflito interno e a busca por redenção também podem ser lidos como paralelos à sua luta pessoal.
 
Curiosamente, o jogo para Dostoiévski não era apenas destrutivo; ele via nisso uma forma de testar o destino e a liberdade humana, temas centrais em sua filosofia. Em cartas, ele descreveu a excitação do risco como algo que o fazia sentir-se vivo, mesmo que isso o levasse à ruína. Esse paradoxo — um homem genial preso a um comportamento autodestrutivo — é um exemplo clássico de como inteligência e impulsividade podem coexistir de maneira trágica.